Entrevista: O Caminho do Sol

Clube - O que é o Caminho do Sol?
O Caminho do Sol, é um roteiro idealizado pelo senhor José Roberto Palma, para se criar uma nova rota turística que cruza 13 cidades do interior paulista, iniciando em Santana do Parnaíba , passando por Pirapora do Bom Jesus, Cabreúva, Itu, Salto, Indaiatuba, Elias Fausto, Capivari, Mombuca, Saltinho, Piracicaba, Ártemis, chegando em Águas de São Pedro. O percurso total tem aproximadamente 240 Km de extensão. Ele foi criado para se fazer a pé, o que levaria 10 dias. Ele é todo sinalizado com setas amarelas a exemplo da trilha espanhola e passa por áreas rurais, matas, fazendas do período colonial e quase todo caminho margeia os rios Tietê e Piracicaba.

Clube - Você sabe o porquê desse nome?
Porque o caminho segue o sentido Leste-Oeste (o Caminho do Sol)


Clube - Esse caminho tem algum fundo místico, assim como o caminho de Santiago de Compostela?

Sim. Ele foi idealizado por pessoas que já haviam percorrido o Caminho de Santiago e sentiram a necessidade de criar um roteiro brasileiro onde as pessoas, durante o caminho, estando em contato com a natureza, tivessem a oportunidade de fazer uma viagem mística de reflexão e auto-conhecimento. No inicio do percurso, recebemos uma espécie de passaporte, que se vai carimbando ao longo o caminho, para comprovar que você percorreu todas as etapas.

Clube - Como você ficou sabendo do Caminho do Sol? Navegando pela internet, encontrei o site www.caminhodosol.org sobre um roteiro para peregrinos de Santana do Parnaíba até Águas de São Pedro, a exemplo do Caminho de Santiago na Espanha, tradicionalmente percorrido a pé, de cavalo ou de bicicleta. Fiquei sabendo que um grupo já havia percorrido o caminho de bicicleta e teriam feito em 3 dias. Fiquei fascinado pelo desafio, pois até então só tinha andado por trilhas nos finais de semana e participado de algumas provas de mountain bike, nunca tinha feito uma viagem mais longa de bicicleta, então comecei a pesquisar mais a respeito.

Clube - Qual é o intervalo médio entre os pontos de apoio?

Para quem faz o caminho a pé, a média diária é em torno de 20 a 25km, mas para se fazer de bicicleta, no primeiro dia pedalamos 78km, no segundo seria 66km e no terceiro 96km.

Clube - Como foi a questão da estadia, alimentação e água durante a viagem? A proposta do Caminho é a simplicidade e o contato com a natureza. Na primeira noite dormimos em Salto, na Fazenda Vesúvio, onde a pousada é simples, mas tudo muito limpo e organizado. Na segunda noite, pernoitamos em Mombuca, uma pequena cidade, onde fomos muito bem recebidos por D. Kátia uma pessoa boníssima, que fez uma comida maravilhosa e nos tranqüilizou com sua boa conversa. O ambiente da pousada, já trazia um conforto, muita paz. Um aparelho de CD, com cantos gregorianos relaxava nossos músculos doloridos. Almoçamos em Cabreuva, em um hotel fazenda muito simpático e em Elias Fausto em uma Pousada, onde fomos recebidos pelo "seu Serra" e em Monte Branco, em uma casa simples mas a comida estava deliciosa. Quanto à água não era problema, pois em todo lugar há poços ou minas e gente disposta a nos ajudar.

Clube - Como é a paisagem durante o percurso, rural, urbana, mata? Saindo de Santana do Parnaíba, seguimos um trecho pelo asfalto, com belas paisagens, no vale do Tietê e cidadezinhas históricas, muito simpáticas, contrastando com o rio Tietê, totalmente poluído (ver foto). Pedalamos um bom percurso em área rural cortando grandes fazendas de gado, milho e cana-de-açúcar e também passamos por dentro de algumas cidades. Numa certa altura do caminho, perguntamos aos moradores locais, perto de onde estávamos. A resposta foi uma surpresa. "Moço, aqui vocês não estão perto de nada".

Clube - E as estradas, asfalto, terra, boas, ruins?
Percorremos algumas estradas de asfalto, mas a maior parte do percurso é feita por estradas de terra. A maioria muito boa, quando não está chovendo.

Clube - O caminho é bem sinalizado, vocês se perderam alguma vez? A organização fornece mapa?
O caminho é todo sinalizado por setas amarelas, mas algumas vezes, por estarmos de bicicleta, passávamos sem perceber por uma seta, mas logo um de nós via e voltávamos ao caminho correto. Pegamos pela internet um mapa e o roteiro muito bem detalhado. Um detalhe interessante, é que em cada local que passamos e tínhamos que carimbar o passaporte, as pessoas já estavam nos esperando, e assim que saíamos, ligavam para o próximo local, informando que já tínhamos partido. Caso não chegássemos até a hora prevista, seria acionado alguém para nos procurar.

Clube - Vocês passaram por alguma dificuldade?
Devido à chuva (de verão, como dizia o Glauco: até março passa!) que caiu nos dois primeiros dias, tivemos muita dificuldade nas estradas de terra, principalmente nas estradas secundárias, no meio de plantações, onde a terra é mais fofa. Ficávamos literalmente enterrados, e o barro grudava nas bicicletas e era impossível prosseguir sem limpar. Com isso perdemos muito tempo e energia e em um percurso que levaríamos algumas horas demorou o dia todo. Justamente por isso, pulamos uma etapa de Monte Branco a Ártemis, pois a chuva era demais e não conseguíamos pedalar devido ao barro. Então aceitamos uma carona de camionete. Outro problema aconteceu com os freios. Devido a chuva e a terra, em alguns trechos uma areia que grudava no aro e virava uma lixa, acabou com a sapata e eu fiquei totalmente sem freios.

Clube - Tem mais alguma situação interessante que gostaria de contar?
Chegando em Ártemis, deveríamos pedalar mais alguns quilômetros, e então atravessaríamos o Rio Piracicaba de Balsa, seguindo até Águas de São Pedro. Ao chegarmos no porto, fomos avisados que a balsa não estava operando, porque o rio estava muito cheio, e era perigoso demais atravessa-lo. Resultado, tivemos que retornar até Ártemis e procurar um novo caminho.

Clube - O que você aconselha para quem quiser repetir a sua viagem?
Se você gosta de pedalar e gosta de aventura, acho que deve fazer o caminho, pois você passa por belas regiões que tenho certeza muitas pessoas nem imaginam que exista, você vai enfrentar alguns obstáculos e dificuldades, mas sem isso não seria uma aventura. Para nós (Carlos, Glauco, João Ricardo e Ângelo) que fizemos nossa primeira viagem de cicloturismo, concluímos que foi uma experiência muito rica, pois testamos nossa resistência, enfrentamos nossos medos e nossas fraquezas, exercitamos nosso companheirismo e aprendemos com a humildade e simplicidade das pessoas do caminho. Uma frase que li em um dos pontos do percurso sintetiza bem o que senti: "A mochila é uma verdadeira lição de humildade. Nela você só leva o que realmente precisa, e nessa hora percebe que há muita coisa desnecessária na vida".