LAGAMAR
Atravessando Parques Naturais
Estava um pouco nervoso pois era a primeira vez que a Gabi pedalaria comigo numa longa viagem e eu não sabia ao certo se ela iria gostar, mas como sua vontade de se aventurar era grande e a iniciativa tinha vindo dela, fiquei tranquilo e relaxei, afinal quem sai na chuva é prá se molhar!
A idéia inicial da viagem era sair pedalando da cidade de São Paulo com destino ao litoral sul do estado, porém as nossas férias limitadas, a dificuldade burocrática de descer a serra pelas rodovias e o fato de já ter feito o percurso até Peruíbe anteriormente, nos fez decidir ir de ônibus até esta cidade.
Na realidade é a partir daí que está o filet mignhon, onde a natureza ainda está preservada e protegida por unidades de conservação. Cercado de Mata Atlântica, praias, mangues e cachoeiras, a região sudeste do Estado de São Paulo e nordeste do Paraná abrange cinco unidades de conservação, reunidas em uma das maiores extensões de Mata Atlântica contínua do país.
No primeiro dia saímos pedalando de Peruíbe com destino a Pedro de Toledo, pequena cidade que dá nome a um dos núcleos do extenso Parque Estadual da Serra do Mar e que possui 75% do seu território ocupado pela Mata Atlântica.
Resolvemos ficar por alí um dia para conhecer melhor o lugar e acabamos encontrando o secretário de meio ambiente da prefeitura, Iberê, que nos recebeu muito bem e nos levou a algumas cachoeiras como a dos Metralhas.Saindo de Pedro de Toledo em direção à Iguape, pegaríamos a Estrada do Despraiado, um caminho de terra que cruza a Estação Ecológica Juréia-Itatins pela Serra do Divisor e tem um visual incrível. Passamos por fazendas, rios, cachoeiras e pudemos ver o Maciço do Itatins com o imponente Dedo de Deus ao fundo.Segundo amigos que nos indicaram a estrada, esta é uma ótima opção de roteiro de cicloturismo para quem quer uma viagem de fim de semana, com a possibilidade de até ficar uma noite no Despraiado e subir o Itatins no dia seguinte.
Para chegar em Iguape, pedalamos mais cerca de 50Km por asfalto sem muito movimento. Iguape é um dos primeiros municípios do Brasil e guarda no seu centro histórico, o maior acervo de construções tombadas do Estado de São Paulo. Conhecemos a cidade e resolvemos no mesmo dia atravessar na balsa para a Ilha Comprida, mais tranquila e com boas áreas de camping.
Rio, sol e mar
A partir daí estávamos entrando na região do Lagamar, como é chamado o trecho que vai do sul de Iguape até o Estado do Paraná. É considerado o terceiro maior complexo lagunar-estuarino e com um dos cinco ecossistemas costeiros mais notáveis sobre a face da terra, a região guarda uma diversidade de fauna e flora inigualável.
A Ilha Comprida também é uma Área de Proteção Ambiental (APA) e possui 74 quilômetros de praias. Pedalamos pela areia da praia, que na maré baixa, mais parece um asfalto novinho, tanto é que até a linha de ônibus urbano usa a areia para atravessar a ilha.
Mais um dia de pedaladas e chegamos em Cananéia. Neste município ficamos encantados com as casas coloniais e a igreja dos séculos XVI e XVII. Todas as construções daquela época eram feitas com Berbigão, uma espécie de massa feita de óleo de baleia, conchas moídas e areia de praia, e que dava uma consistência muito resistente. É de Cananéia que se pega um outro barco até o Parque Estadual da Ilha do Cardoso com 90% dos seus 140Km quadrados cobertos por Mata Atlântica. Um lugar fantástico!
Na ilha, fizemos vários trekkings até as cachoeiras, praias e mangues da região e ainda tivemos a sorte de apreciar um pôr-do-sol magnífico. A restinga ao sul da comunidade do Marujá na Ilha do Cardoso, possui 18Km e no final dela encontramos a Barra do Ararapira, que é a divisa natural dos estados de São Paulo e do Paraná. É um dos lugares mais selvagens que conheci na região Sudeste do Brasil! Continuamos a pedalar pela praia após cruzar numa canoa, para o outro lado, onde começa o Parque Nacional do Superagüi, já no Paraná. O Superagüi é um santuário ecológico que em 1991 recebeu da UNESCO o cobiçado titulo de Reserva da Biosfera.
Pedalamos mais 40Km pela praia que continuava deserta, sem nenhum ser humano, só gaivotas, gaviões, golfinhos e siris. A parte sul da Ilha fica dentro da Bahia de Paranaguá e de frente para a Ilha das Peças e a Ilha do Mel. Ficamos mais uma noite hospedados numa pequena pousada na vila do Superagüi. Na vila fica um posto do IBAMA e pode-se conseguir informações sobre as trilhas, as aldeias indígenas dos Guarani, a avistagem dos papagaios Chauás, entre outros programas para se fazer além de descansar naquele paraíso.
Atravessamos de voadeira para a Ilha das Peças, onde pedalamos nossos últimos 13Km da viagem antes de pegar a balsa que nos levou de volta para a civilização na cidade de Paranaguá. Fomos abençoados todo o tempo por ótimos dias ensolarados e vento a favor, além das coincidências que acontecem com todos os viajantes e que fazem das roubadas, grandes estórias. No fundo, eu sabia que a Gabi também ia se contaminar com o vírus de viajar de bicicleta, mas eu não imaginava que antes de colocar a bike no ônibus que nos levaria de volta para casa ela diria:
- Victor, eu tava pensando .... será que em julho vai nevar nas Serras Gaúchas?
Projeto Lagamar
O cicloturismo é uma forma diferente de viajar. É uma mistura de esporte, aventura e turismo, onde o viajante entra num ritmo diferente das viagens de carro, ônibus, trem ou avião. O tempo não importa, o que vale é curtir o caminho e não somente o destino que se quer chegar. Este ritmo, geralmente mais lento, que a bicicleta leva o viajante, lhe proporciona interagir com as pessoas, paisagens e culturas diferentes por onde quer que ele passe. O objetivo do Projeto Lagamar, assim como outras viagens de bicicleta realizadas anteriormente, foi descobrir lugares com grande potencial ecoturistico e cultural, além é claro, do prazer e a liberdade que isto nos proporciona. Desenvolvemos um roteiro de cicloturismo e caminhadas incluindo um levantamento de estradas, trilhas, praias, pousadas, campings, restaurantes, centros culturais, artesanato e a prática de outros esportes de ação nas regiões por onde passamos.
Desta forma, conhecemos também um Brasil diferente, simples, porém rico em belezas naturais e culturais, onde seu povo hospitaleiro, muitas vezes foi o determinante para o sucesso das viagens.
AO SABOR DO VENTO por Vitor Pereira Livro (não publicado) sobre a viagem de bicicleta pelo litoral, saindo de São Paulo até Salvador. Todas as emoções, dificuldades e prazeres que representam a liberdade de viajar livremente de bicileta. (36 páginas) Download de Ao Sabor do Vento.pdf (200K)